Basta Amar

Essa minha vinda para a Europa, mais do que qualquer coisa, está me ensinando a amar de verdade, a Deus, a mim mesma, as pessoas, o mundo.

A Sarah (obrigada, flor) me mandou uma entrevista de uma freira francesa que eu não conhecia, Irmã Emmanuelle, e gostei demais das palavas dela. Segundo a Sarah, a freirinha morreu pouco antes de completar 100 anos, trabalhou muito tempo na cidade do Cairo com pessoas carentes e deixou como legado uma fundação que cuida de mais de 70 mil crianças em oito países diferentes.

Entrevista:

Como vai a senhora, irmã Emmanuelle?

Ainda dá pra ir bem. Continuo bem. Você pode me afastar um pouco? Eu estou muito no sol. Pronto, assim está melhor.

A última vez que nos encontramos, há dois anos, a senhora havia insistido numa frase: “Somos todos diferentes, somos todos feitos para amar”. Amar sobretudo, é seu objetivo permanente.

Eu ainda era bem jovem quando fui surpreendida pela frase de Bernardette Soubirous: “Basta amar”. Essas simples palavras. Amar Deus, se deixar amar por ele e este amor, distribuí-lo aos seus irmãos e irmãs. Basta amar.

Santo Agostinho dizia: “A medida do amor...”

“É amar sem medida”. É absolutamente verdade. É preciso amar sem medida. Senão não funciona. Se a gente pensa sempre em si... Deixa para lá. Basta amar de toda sua alma, sua inteligência, seu ser inteiro.

E isso pode se aprender?

Isso se desenvolve, pouco a pouco. E isso rende uma vida extraordinariamente bela. A medida cresce com o tempo. Mas amar não é uma coisa simples. É um suspiro.

Um suspiro?

É apaixonante deixar este suspiro te levar.

(...)

E o carpe diem? O pequeno instante que pode-se aproveitar? A senhora acredita que utilizou o seu?

O carpe diem pode ser algo muito bom. É preciso saber aproveitar, hora por hora, minuto por minuto, a alegria que lhe foi dada. Ela nos é muito frequentemente oferecida, muito mais do que pensamos. É preciso alcançá-la a tempo. Senão perde-se a vida, pedaço a pedaço. A noção do instante é fundamental para mim. Não há nada além dele, do instante presente, capaz de fazer a vida apaixonante. Não deve-se perder-se nem no passado nem no futuro, mas permanecer no presente. Quando eu dava aulas para moças, eu as ensinava a serem felizes no minuto presente sempre que possível.

A noção de luta, você a ensinou também?

Ah la la... E como! E como! É importante, a luta. É a luta que dá a dignidade aos homens. Que faz um homem ficar de pé.

Para durar tanto, e logo chegar aos 100 anos (tadinha!), a senhora deve ter amado muito este mundo.

Se eu não tivesse amado, teria chegado à mesma idade! Não é essa a questão. A questão é que amar o mundo dá à vida uma coloração tão bela. Cativante.

A vida sempre a cativou...

Cada minuto nos traz uma coisa de boa a fazer, seja em nós mesmos, seja rezando, seja junto aos outros. Na Europa eu constatei um tipo de aborrecimento. A Europa está morosa. Com os catadores de lixo do Cairo isso não existia. Desculpe a palavra, mas todo mundo se divertia! Eu voltei para a Europa em 1993 pensando que a vida seria maravilhosa e me surpreendo com gente que não pára de se lamentar. Do tempo, dos pais, do marido, da mulher... Tudo passa!

Estes anos no Cairo foram mais belos de sua vida?

Foi uma maravilha. Nada se comparou com aquilo.

(...)

Por que essa experiência levou a senhora ao fundo de si mesma?

Porque me levou a ver as relações que existem e que são muito boas, muito fortes, com Deus, em primeiro lugar, e entre os homens. Como o menino Jesus, a dar com uma mão e receber com a outra.

Convivendo com pessoas de religiões diferentes...

Ah, mas eu não me preocupo com religião, isso não me interessa. Cada um tem o direito de ter sua religião, isso se respeita mutuamente. Tenho milhares de amigos muçulmanos. Sempre falamos de religião, nos respeitando.

A senhora acha que as pessoas ainda sabem fazer isso, discutir religião?

Cada vez mais. Só o que eu vejo em torno de mim são cristãos e muçulmanos conversando. Esse diálogo entre religiões me interessa, porque ele prova que as pessoas estão mais abertas, não estão olhando apenas para seus umbigos e seus interesses, mas estão conseguindo se respeitar. O outro pensa, procura, respira. E eu tenho que tentar compreendê-lo. Você aceita o outro, ele é diferente, e isso é normal. Não fomos todos criados segundo o mesmo modelo, e isso é muito bom.

(...)

A senhora pensa neste momento? De seu reencontro com Ele?

Eu penso muito. Eu me digo: “Emmanuelle, um pouco mais de paciência”. O que me interessa são os reencontros. Isso é bonito. Como dizia o padre Théodore Ratisbonne, a morte é o dia mais bonito da vida. O dia em que, finalmente, a noiva encontra o noivo face a face. O filho encontra seu pai, a esposa seu esposo. É o dia mais belo da vida. Não é tão mal assim, hein?

Isso quer dizer que a senhora espera sem medo?

Eu não tenho medo da morte. Mas do que a precede, bom, já não tenho tanta certeza. Enfim, eu já me combinei com a Santa Virgem: rogai por nós pecadores, agora e na hora de nossa morte; eu lhe disse milhões de vezes, eu me entrego a ela, e não me preocupo.

Ela sempre foi uma presença importante para a senhora.

Ah, sim. Maria é meu sorriso. Meu coração.

(...)

Comments

Nat Canto said…
Nossa, adorei a entrevista!! nem sei como vim parar nessa pagina, acho que cliquei em algum link sem perceber mas, enfim, valeu, adorei!
Paola Ranova said…
que bom :-)

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